Alinne Moraes diz sem o menor problema que quando leu a peça "Dorotéia", de Nelson Rodrigues — que estreia hoje no Teatro Poeira — se identificou de imediato com um dos dilemas da personagem-título: o de querer esconder a sua beleza.
— Comecei a carreira de modelo cedo. Com 14, 15 anos, com book debaixo do braço, pegava ônibus em São Paulo e me sentia um pouco aflita por ouvir cantadas grosseiras. Então, tentava me esconder com um boné, fazia tudo para não chamar a atenção — conta Alinne, que completa: — A beleza pode ser sua aliada ou um fardo. Depende de como se lida com ela.
Para Dorotéia, tornou-se um fardo após a morte de seu filho. Na história, as mulheres de sua família sentem nojo dos homens. Ela é a única que gosta deles e de sexo. Por isso, decide ser prostituta com muito prazer. Mas quando seu filho cai doente, o médico exige tê-la como pagamento do tratamento. Enquanto transam, o menino morre. Dorotéia, então, se fecha e procura a família como uma espécie de salvação. Só que as primas viúvas (interpretadas por homens) exigem que ela fique feia para continuar com elas.
Feia sem nenhum truque
Mas como enfear Alinne Moraes? A atriz ri e explica que não usa nenhum recurso cênico.
— A feiura está dentro dela. Não terão efeitos, truques. O teatro é o lugar onde posso brincar, tornar real aquilo que quero, que acredito. E não duvido que esteja funcionando — diz a atriz, que faz no teatro sua segunda prostituta da carreira: a primeira foi Vera, no especial "Amor em quatro atos" (2011): — É um arquétipo desafiador para as atrizes. Mas as duas são bem diferentes. A da TV era amarga, a do teatro é doce.
Com 29 anos, Alinne afirma que precisava ter passado pelos trabalhos anteriores, como a tetraplégica Luciana de "Páginas da vida", para ter estofo para Dorotéia.
— Acho que já tenho história para contar da vida. E tudo vem na hora certa. Talvez hoje não fizesse bem a lésbica de "Mulheres apaixonadas". Clara precisava da ingenuidade dos meus 17 anos — analisa a atriz.
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